sweet, sweet fall
O Outono chegou com um vento frio e gorduroso das castanhas a serem assadas na calçada da rua. "É uma altura mágica" pensou ela enquanto observava uma folha amarela a cair cuidadosamente. É quando tudo está a mudar, a morrer, mas de uma forma tão delicada e harmoniosa que é impossível não pensar em magia. Que existe algo mais.
O ar frio que sente na cara e torna o seu nariz vermelho é o mesmo que queima quando ela acende aquela vela, com o cheirinho de flores selvagens-sempre selvagens, que lhe aquece a alma, a lua torna-se mais brilhante no meio de tanto nevoeiro e os cogumelos nascem mesmo quando tudo parece uma advertência à vida. Mas a vida arranja sempre um jeito, não é? A vida encontra sempre uma maneira.
É para isto que o Outono é preciso. Para que as pessoas possam ver como a mudança e a morte são necessárias e naturais. Que o ciclo é harmonioso desta forma e que por mais que pareça cruel, frio e devastador, a vida vai sempre arranjar alguma forma de seguir e com beleza. Ela precisa do Outono para isto. Para sentir o calor da vela na palma da sua mão e relembrar que o amor é transcendente. Para ver a vela a transformar-se em líquido, soprar a chama e, em segundos, ver o líquido a solidificar-se. Claro que é uma vela já diferente, uma vela que já queimou, que já tem marcas e uma história, que já perdeu algo de si. Mas, mesmo assim, volta a arder e a irradiar aroma. Assim como é a resiliência.
Ela é metade mulher e metade porcelana, é mil e uma melodias e sente-se mais poesia do que mulher. Esconde por de trás do riso uma melodia triste e lenta e um fogo imenso E precisa do Outono para tirar tempo para si, dormir ao som dos pinheiros e escrever ao cheiro da terra molhada. Precisa para se tornar mais forte ao reencontrar as suas fraquezas. A natureza renasce todos os anos então, nós humanos, também o somos capaz de o fazer. Ao longo de todas as nossas vidas. As nossas células transformam-se de forma contínua, o nosso cabelo muda de uma forma contínua, as nossas unhas crescem cada vez mais por dia. Mesmo que numa percepção vaga, uma infinidade de infinitos imperceptíveis, estamos em constante mudança e renascimento. E não é só física: se o Outono ensina algo na sua nostalgia é que todos os anos a tua alma se revoga e se torna numa luz diferente. E ela recentemente percebeu algo: tudo é perfeito no meio da confusão. A posição da lua, a brisa que dança com o meu cabelo enquanto espero pelo autocarro, o café que entorno sem querer no meu cachecol, a música que dá no centro comercial, aquela menina que fez-me caretas no meio de uma multidão, o frio, o fogo, os átomos daquela folha, os olhos dos meus cães, enfim, tudo. E para se manter este balanço de perfeição então houve uma aprendizagem contínua, uma sabedoria. E isso só é possível com almas velhas. Talvez nada se perca, apenas... se transforma. Talvez eu já fui poeira de estrela e um dia serei parte daquela folha amarela. Talvez a morte seja só uma metáfora e o amor será sempre transcendente.
O Outono ensinou-lhe a sentir a dor.



Lindo texto !
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