Slut pride

Quando tinha 10 anos fui para a escola com umas meias de rede azuis. Tinham flores desenhadas e eu achava-as tão, mas tão divertidas! Era uma rapariga de dez anos, inocente e que achava que o mundo era uma imitação do que via nos filmes fabulosos da Disney. No final das aulas, ao esperar que a minha mãe me fosse buscar à escola, um grupo de rapazes mais velhos juntaram-se à minha volta e começaram a insultar-me. A insultar-me por causa das minhas meias. A chamar-me de puta. A dizerem que eu era uma puta e que me ia vender. Repito: tinha dez anos. Esta foi a minha primeira experiência mais marcante de slutshaming. Aos inocentes dez anos.
Com o tempo fui entendendo que o comportamento das mulheres é constantemente avaliado e julgado por critérios completamente sexistas e hipócritas. Este julgamento apenas faz com que as mulheres se diferenciem entre elas, se distanciem, que estejam sempre em competição umas com as outras e que não se defendam. Muitas das situações de slutshaming que sofri foi por parte de outras mulheres e muitas destas situações não tive ninguém a defender-me, mesmo que esteja rodeada de pessoas idênticas a mim e que passavam pelo mesmo. É como aquela frase cliché "vejo muitos humanos mas muita pouca humanidade". Confesso que ter sido educada nesta sociedade fez com que muitas vezes eu própria compactuasse com estes comportamentos e, como tal, peço desculpa a todas as mulheres que fiz com que sentissem inferiores e mal só por quererem viver da forma que querem. Lamento mesmo ter sido aquela pessoa com vocês, lamento ter respondido da mesma moeda quando vocês me atacavam, lamento por isto tudo. 
Somos vadias. Vadias porque usamos aquela camisola decotada, vadias porque fomos a uma festa com uma saia muito curta, vadias porque já beijamos vinte lábios diferentes, vadias porque dizemos que "não" a um homem. Temos a nossa liberdade presa por estas correntes invisíveis mas que se fazem sentir de uma forma tão esmagadora que me impede de respirar. Tudo é analisado: se falamos com aquele homem, se somos pessoas "demasiado" simpáticas já estamos a ser "oferecidas", enfim, todo um conjunto de coisas mínimas mas que se tornam num enorme tornado. E é tudo tão hipócrita! Porque é que nós somos as usadas e as perdidas e os rapazes são glorificados por fazerem o mesmo? Sabem que muito do slutshaming que sofri foi por parte de rapazes com quem tinha estado? Por ter feito o mesmo que eles e com eles? Mas eles são um máximo e eu? "O corrimão onde todos metem a mão", como tantas vezes diziam. Pois é. Isto deixa marcas.
Quero dizer que: a sexualidade de cada um é algo tão íntimo que não cabe na cabeça de ninguém haver policias de sexualidades alheias. Não entendo como em 2017 ainda existem julgamentos de personalidade baseados na sexualidade.
Todas nós temos o mesmo valor, independentemente da forma como vivemos a nossa vida sexual e como nos vestimos. Viver nesta sociedade tão machista resulta em sermos maltratadas apenas por vivermos livremente. Uma mulher forte e confiante mete medo e inspira insultos. Uma mulher que veste o que quer, que publica as fotografias que quiser, que viva a sua vida sexual da forma como quiser, será uma vadia. "Lá vai aquela que mete fotografias semi-nua, que porca". "Lá vai aquela que namora mas que anda sempre decotada, não tem respeito pelo namorado". "Lá vai aquela que acha-se demasiado boa para aceitar namorar com António". Frases deste género são frases tão comuns mas que me deixam sempre chocada quando as ouço.
Acho que já chega destes policias sociais. Acho que devemos todas ser confiantes e termos um amor próprio tão louco que nos permite apenas sermos nós mesmas, sejamos pessoas discretas, ousadas, enfim, sejamos como formos realmente! Afinal de contas, faça o que eu fizer irei sempre ter alguém a chamar-me de vadia. Até já sofri slutshaming só pelo simples facto de ter seios grandes, algo que nunca irei entender. Esta cultura enfraquece as mulheres, torna-nos inseguras e divide-nos, potenciando esta competição que me magoa profundamente. Se ser vadia é ser livre, viver como quero e sem medos, ser feliz na minha pele e ser protagonista da minha vida: então sou vadia, sou vadia todos os dias. Temos mesmo que reivindicar o direito aos nossos corpos e à nossa posição na sociedade livres de assédios e de julgamentos morais que só servem para nos inferiorizar.  

E para todas as pessoas que me fizeram mal e a muitas outras mulheres; para as mulheres que, como eu, já compactuaram com isto mas abriram os olhos e o coração, deixo este bocado da música "Praying" da Kesha: 


I hope you're somewhere praying, praying
I hope your soul is changing, changing
I hope you find your peace
Falling on your knees, praying

Fotografia por Raquel Canas




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